Música animada saía dos alto-falantes improvisados pelo laptop de Oskana, colocado sobre a mesa de jantar. A moça se preparava para sair com a mãe, que, mesmo sendo uma companhia taciturna, tinha se mostrado bastante solícita a levá-la por Staryy Dom. Sempre em passeios noturnos. Não estavam nos melhores termos, mesmo assim, havia uma casa onde Oskie poderia dormir e ter conversas longas com sua estranha e distante criadora. Há muito tempo ela sabia o tipo anormal de relação que teriam. Pelo menos a mãe estava ali, diante dela. Apesar dos móveis alugados e da casa de revista, o som ecoando era parte de ambas, uma balada russa distorcida em um pop nova era. A única canção que Olenska não rejeitou nos primeiros acordes.
— Vou mesmo poder estudar aqui? — O tom da jovem era animado. Não se importava de usar a língua materna, num russo rápido e alto.
— Se suas notas a qualificarem para a universidade, sim — O tom baixo de Olenska denota sua afirmação, mas também uma crítica velada. — Me agradaria mais que continuasse seus estudos em Budapeste ou Odessa, mas se você quer sua graduação aqui… Desde que siga minhas regras… Pode ficar.
— Não direi que somos parentes, evitarei dar meu nome a qualquer desconhecido — Ela revirou os olhos. — E não vou te procurar na livraria. Mãe, qual é o problema com tudo isso? Não estamos mais na Rússia. Ninguém vai ouvir Rurikich com estranheza. Olhe pra mim e para você…
O tom da moça estava quase irritado. Não tinham saído de São Petersburgo por causa daquilo, afinal?
A bruxa estava se preparando para responder quando ouviram a campainha. Se entreolharam. Ninguém tinha aquele endereço, exceto… Num movimento mais rápido do que deveria, quase traindo sua natureza inumana, a feiticeira Tremere colocou-se à porta.
Oskie a olhou surpresa. Quando sua mãe se tornara tão ágil? Ou ela sempre teria sido assim? As perguntas perderam o sentido quando Oskana viu a expressão de Olenska diante do belo rapaz à porta. Ouviu vozes, talvez mais gente no corredor. Porém, a moça estava vidrada no choque e intimidade do olhar que eles trocaram. Já tinha visto alguns poucos conhecidos de sua mãe a olharem de forma imprópria, mas ela não retribuiu qualquer um deles e até caçoava de olhares assim. Só que não era isso…
— Não sabia que você tinha visitas. Precisamos conversar… Posso entrar?
— Claro… Entre… — A feiticeira fitou as pessoas no corredor lembrando-se deles na noite de Ivana Kupala. Os pilares… Mas porque em sua casa? — Vocês são bem vindos também. Por favor… entrem.
A mãe deu espaço para que quatro estranhos se amontoassem na ante sala com olhares curiosos e incertos. Oskie baixou a tela do notebook, interrompendo os acordes do refrão. Tentou parecer natural, mesmo impressionada com o rapaz alto de chapéu e seus companheiros, duas moças bonitas e pouco mais velhas que ela, além de um rapaz que lhe sorriu um pouco mais amistoso que os demais. Teria ficado constrangida, não fosse a conversa, quase aos sussurros de sua mãe com o homem de chapéu.
— Sinto que essa não é uma boa noite… O que aconteceu? – Olenska tentou manter o tom amistoso, mas baixo. Usando seu ucraniano e esperando que a filha fizesse o mesmo.